05/11/2025

Split payment começa a funcionar a partir do ano de 2027 e facultativo

Por: Jéssica Sant'Ana e Lu Aiko Otta
Fonte: Valor Econômico
O split payment - sistema de recolhimento automático dos tributos previsto
na reforma tributária do consumo - vai iniciar em 2027 de forma opcional e
por etapas. Numa primeira fase, será usado de maneira facultativa nas
vendas realizadas entre empresas, chamadas de “B2B”. Depois, numa
segunda fase, quando houver maturidade do mercado, o sistema virará
obrigatório para transações “B2B”. Por último, o mecanismo será
expandido para as vendas ao consumidor final (“B2C”).
As informações são do gerente do Projeto de Implantação da Reforma
Tributária na Receita Federal, Marcos Hübner Flores, em entrevista ao Valor.
Ele disse que ainda não há previsão de datas para as fases dois e três do split
payment. “Esse cronograma vai depender da maturidade dos agentes de
mercado”, disse.
Um grupo de trabalho do governo vem trabalhando no desenvolvimento do
sistema, que permitirá o recolhimento dos novos tributos - a Contribuição
(CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) - no momento da liquidação
financeira da transação, o que não acontece hoje.
Flores explica que o governo decidiu lançar o split payment em 2027 de forma
opcional e faseada porque não é possível saber quando cada instituição
financeira e provedor de serviço de pagamento estará apto para prestar o serviço
aos clientes. As instituições financeiras precisarão adaptar seus sistemas para
rodar o “split” em todos os meios eletrônicos de pagamento.
“À medida que isso for avançando e também por meio de pagamento, ou seja,
sendo usado para boleto, PIX, TED, vai passar a ser obrigatório no B2B. Essa
é a segunda fase. Quando isso vai acontecer? Depende do mercado", reforçou
o técnico da Receita. Ele disse que o governo não vai esperar todos os
prestadores de serviço financeiro estarem adaptados, mas sim a grande maioria
para que a obrigatoriedade entre em vigor.
Ainda faltam muitos parâmetros por parte dos setores público e privado”
— Cinthia Benvenuto
Daniel Loria, sócio-fundador do Loria Advogados, considera acertada a
estratégia do governo de implementar o split payment por etapas. "Eu acho que
essa estratégia é muito boa, do ponto de vista de segurança de implantação, para
você primeiro testar o sistema e depois escalar. Com o fato de ser opcional, fica
sob responsabilidade da iniciativa privada se organizar para ver quem quer fazer
o split e quem não quer fazer.” Ele lembra que o faseamento está previsto na
Lei Complementar nº 214, a primeira de regulamentação da reforma tributária.
Cinthia Benvenuto, sócia da área tributária no Innocenti Advogados, também
considera a estratégia do governo "prudente e tecnicamente necessária",
considerando os desafios operacionais e jurídicos envolvidos. "Empresas já
estão mais habituadas a lidar com sistemas fiscais e contábeis sofisticados, já o
mercado B2C não estará preparado a curto prazo para uma transição segura, já
sendo inclusive praxe os períodos teste e faseados para grandes mudanças,
como se deu por exemplo com a implementação do E-Social.”
A adoção gradativa do novo sistema também ajudará na mitigação e controle
de riscos e dificuldades que certamente serão enfrentados no decorrer das
transações, seja por parte das empresas, ou do próprio Fisco, diz Priscila Regina
de Souza, sócia da área tributária do Loeser e Hadad Advogados.
Uma preocupação das empresas é sobre a possibilidade de não haver o
creditamento imediato previsto na reforma tributária, sem a obrigatoriedade do
split payment. Flores afirma que isso não vai acontecer, porque o sistema de
apuração assistida, com controle de crédito, está pronto. Assim, tão logo haja o
pagamento pelo adquirente a partir de 2027, o crédito será garantido ao
contribuinte, afirma o auditor-fiscal da Receita. Em 2026, na fase de testes, não
haverá cobrança de CBS e IBS, por isso não terá split payment.
Loria acredita que, com a entrada em vigor do “split” mesmo que de maneira
opcional em 2027, haverá interesse das empresas pelo sistema, para garantir o
creditamento com maior segurança. "Haverá uma convergência de interesses
do mercado, porque a empresa compradora vai querer ter o split para garantir
o crédito”, afirma.
“Tem outros países, como a Índia, que também condicionam o crédito ao
pagamento do débito pelo fornecedor, mas que não tem split, e as empresas se
sentem injustiçadas, porque não têm como controlar se o tributo está pago e se
o crédito dela é bom”, diz Loria. “No B2B, o split é muito funcional, tem muito
valor para as empresas, não só para o governo", acrescenta ele, que foi diretor
da secretaria extraordinária da reforma tributária do Ministério da Fazenda.
Por isso, ele acredita que haverá um grande interesse do mercado em se adaptar
rapidamente ao split payment no caso das transações B2B, mas ressalta que o
desafio será maior para implementação na venda para o consumidor final (B2C)
- não há geração de crédito ao consumidor.
Cinthia avalia que é difícil dizer quando o mercado estará maduro para a adoção
do split payment, pois ainda faltam muitos parâmetros por parte dos setores
público e privado. "Os testes operacionais que acontecerão em 2026 e os ajustes
regulatórios e tecnológicos que devem iniciar nesse mesmo ano nos trarão
maior previsibilidade acerca da consolidação da confiança e estabilidade do
sistema, [mas] hoje infelizmente é difícil prever uma data."
“É crucial que um percentual elevado de empresas já esteja testando e operando
no modelo facultativo, de modo que erros e inconsistências sejam identificados
e solucionados", diz Priscila, ao avaliar a maturidade necessária antes de o split
payment se tornar obrigatório.
"Dessa forma, levando em conta o histórico de grandes mudanças tributárias
no Brasil, será um desafio muito grande acreditar que a maturidade para adoção
obrigatória do split ocorra nos primeiros anos da implementação da reforma”,
afirma ela. “Dependerá de como irá avançar a fase facultativa do split, a
aceitação do mercado, a tecnologia envolvida e a superação das dificuldades e
vulnerabilidades identificadas", completa a tributarista.
Alex Hoffmann, CEO e cofundador da PagBrasil, empresa de processamento
de pagamentos digitais, acredita que o novo sistema não começa a funcionar
em 2027, mesmo faseado e de forma opcional. “Não é que eu seja cético, só
acho muito improvável.” Ele considera que 2028 é um prazo mais viável.
O pagamento de impostos em tempo real, como proposto no split payment, é
possível do ponto de vista tecnológico, avaliou Hoffmann. "Ele vai ser lindo de
ver quando ficar pronto, mas as pessoas não sabem a complexidade que tem
por trás”, pondera. Além disso, empresas brasileiras estão em diferentes graus
de maturidade tecnológica, diz ele.
Para Hoffmann, o prazo de quase dois anos é curto porque muitas empresas
nem começaram a adaptar os sistemas para emitir notas no novo sistema
tributário. O Valor mostrou que a Receita Federal é otimista e acredita que não
haverá problema na emissão das novas notas fiscais.