24/11/2025

STJ admite ação por crime tributário antes da constituição do crédito

Por: Danilo Vital
Fonte: Valor Econômico
Nos casos em que há embaraço à fiscalização tributária ou cometimento de
outros crimes, é possível iniciar a persecução penal por crime tributário antes
do encerramento do processo administrativo fiscal e da constituição do crédito.
A conclusão é da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que decidiu por 3
votos a 2 afastar a aplicação da Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal
Federal. O enunciado tem a seguinte redação:
Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo
1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo.
STJ afastou Súmula 24 do STF porque crime tributário ocorreu em situação que
embaraçou a fiscalização da administração
A Súmula 24 serve para proteger o contribuinte, ao determinar que ele só seja
alvo da persecução penal quando administrativamente ficar comprovado que
houve supressão ou redução ilegal de tributo.
No caso concreto, a acusação é de esquema fraudulento com uso de empresas
de fachada para simular operações de compra e venda de mercadorias de modo
a acobertar operações por outras empresas, as quais deixam de recolher o
imposto devido.
O Ministério Público da Paraíba preparou e ofereceu a denúncia ciente de que
havia procedimento de investigação fiscal instaurado, inclusive com a
identificação dos responsáveis na via administrativa.
Súmula 24 do STF
O tema dividiu a 6ª Turma. Relator do Habeas Corpus, o desembargador
convocado Otávio de Almeida Toledo destacou que não se está diante de
situação em que o Fisco permanece alheio à ação delituosa e sem saber da
sonegação de valores.
Para ele, seria totalmente possível fazer o lançamento dos tributos em favor dos
reais devedores, inaugurando o contraditório administrativo e possibilitando o
questionamento da constituição do débito tributário. Assim, não há justificativa
para não cumprir a Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal.
“Seria um contrassenso admitir o prosseguimento da ação penal com relação
aos delitos de organização criminosa e lavagem de dinheiro lastreados nos
delitos tributários sem que a condição prevista no enunciado vinculante, que
condiciona sua tipicidade”, apontou.
Votou com ele o ministro Antonio Saldanha Palheiro. Ambos ficaram vencidos.
Complexidade do crime tributário
Abriu a divergência vencedora o ministro Og Fernandes, acompanhado pelos
ministros Sebastião Reis Júnior e Rogerio Schietti. Eles identificaram uma
situação de distinguishing (distinção) suficiente para afastar a incidência da súmula
vinculante do STF.
A interpretação é de que o enunciado foi previsto para circunstâncias ordinárias
e não alcança os casos em que sonegação fiscal foi alcançada por meio de uma
rede de fraudes e falsificações que visavam dificultar a atuação do Fisco.
Por esse motivo, tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o STJ têm
jurisprudência afastado ocasionalmente a aplicação da Súmula 24 para permitir
o andamento de ações penais por crimes tributários.
“A jurisprudência estabelece que havendo embaraço à fiscalização tributária e
o cometimento de outros crimes, é possível o afastamento da Súmula
Vinculante 24”, resumiu o ministro Og Fernandes.
No caso dos autos, o Fisco não teria como identificar o montante de seu crédito
e os reais devedores porque o esquema se baseou em uma complexa estrutura
criminosa com uso de dezenas de CNPJs e movimentação de R$ 880 milhões.
“Tais circunstâncias, assim, autorizam, sem nenhuma ressalva, a mitigação da
Súmula Vinculante 24, uma vez que é patente o embaraço à fiscalização
tributária e os indícios da prática de outros delitos, de natureza não fiscal,
hipóteses em que o próprio Supremo Tribunal Federal (órgão editor do verbete
vinculante) rechaça sua aplicação.”
REsp 919.313