26/11/2025

Receita garante créditos de PIS/Cofins sobre insumos

Fonte: Valor Econômico
A Receita Federal alterou seu entendimento e passou a permitir que empresas tomem créditos de PIS e Cofins sobre custos com produtos necessários para cumprir imposições legais - como a obtenção de alvará ou licença ambiental. A interpretação mais benéfica aos contribuintes está na Solução de Consulta nº 165, editada pela da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit). Por ser vinculante, ela deve ser seguida por todos os auditores fiscais do país.
O tema é um desdobramento do que foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recurso repetitivo, no ano de 2018 (Temas 779 e 780). Desde o julgamento, contribuintes tentam enquadrar determinadas despesas como bens ou serviços essenciais ou relevantes para a atividade econômica, critérios necessários para obter os créditos. Eles servem como moeda para o pagamento de tributos.
Segundo especialistas, o STJ não especificou quais seriam as imposições legais que permitiriam a tomada de crédito das contribuições sociais. Por conta disso, deixou em aberto para a Receita decidir o que poderia ou não se encaixar na tese. Nesse tema, as decisões da esfera administrativa costumam ser contrárias aos contribuintes. Já o Judiciário é mais flexível, de acordo com advogados.
No caso analisado pela Cosit, a situação é bem específica, mas tributaristas entendem que pode servir para outros contextos. A dúvida partiu de uma operadora portuária, que busca crédito sobre o custo para a limpeza e manutenção de caixas separadoras de água e óleo. É uma obrigação imposta por leis estadual e municipal, como condição para o licenciamento ambiental.
A companhia diz que é obrigada a enviar, periodicamente, relatórios sobre a limpeza e manutenção dessas caixas, além de ter de contratar laboratório autorizado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) para realizar “coleta e análise do efluente gerado nos separadores”, outra exigência legal.
Além disso, precisa seguir normas que obrigam a construção e implementação de sistemas de drenagem com separador de água e óleo, assim como de controle de emissão dos efluentes. A empresa defende que “o não cumprimento dessas obrigações pode acarretar a suspensão da licença e, por consequência, das atividades da empresa, sujeitando-a a sanções pecuniárias”.
Na resposta, a Cosit cita entendimento anterior, na Solução de Consulta nº 35, que vedou os créditos nessa mesma situação. “Os dispêndios que não têm relação direta com o processo produtivo da pessoa jurídica e consistem em itens exigidos pela legislação relativos à pessoa jurídica como um todo", disse a Receita, na época.
Seis meses depois, porém, mudou de interpretação, reformando parcialmente a solução antiga. Afirma no novo texto que, para a emissão de alguns alvarás, é preciso verificar não só o preenchimento de requisitos, como se "exige que esse licenciado execute, de forma contínua, determinadas ações vinculadas aos efeitos das atividades anteriormente autorizadas”. No caso da operadora portuária, seria a limpeza e manutenção da caixa separadora de água e óleo e o controle e monitoramento de pragas e vetores.
Na visão da Receita, a primeira é uma atividade inerente ao processo produtivo da companhia, pois “está diretamente vinculada ao exercício efetivo das atividades econômicas da interessada, pois trata de ações que seriam desnecessárias caso ela [a interessada] não estivesse exercendo essas atividades”.
Ressalva, porém, que o entendimento não vale para controle de pragas, pois é exigido a todas as pessoas jurídicas. A interpretação aplica-se para os casos que, cumulativamente, se refiram a legislações específicas sobre a área de atuação e que “estejam diretamente vinculadas ao exercício efetivo das atividades econômicas da pessoa jurídica em questão e não impliquem em dispêndios que seriam desnecessários caso essa pessoa jurídica não estivesse exercendo tais atividades”.
Segundo a tributarista Bianca Mareque, sócia do Vieira Rezende Advogados, a solução de consulta diferencia quais imposições legais podem gerar crédito. “Ela dá um norte para qual é a imposição legal que tem que ser observada para fins de tomada de crédito, que é aquela necessária para sua operação funcionar”, afirma. “É possível as empresas tentarem explorar esse entendimento para outros créditos”, acrescenta.
Ela orienta que as companhias enquadradas na situação das caixas separadas de água e óleo podem usar créditos para quitar os tributos daqui para frente. “Para o passado, o ideal é ajuizar ação, porque, se não, precisa retificar as obrigações acessórias e isso é complicado”, diz. Também é possível, adiciona Bianca, formular uma solução de consulta para a situação específica da empresa.
A tributarista detalha que a taxa para obter o alvará em si não dá o direito ao crédito tributário, mas sim os custos vinculados a essa obtenção, desde que sejam requisitos legais. “Qualquer produto que seja exigido para obter uma licença”, exemplifica.
Geraldo Wetzel Neto, sócio do Bornholdt Advogados, diz que o entendimento, apesar de ser favorável, é muito restritivo. “Quando se fala de créditos de PIS e Cofins é sempre uma matéria muito burocrática”, afirma. Na visão dele, não necessariamente se aplica para outros casos, mas pode beneficiar setores como aviação e transporte.
“Acho que ela realmente pode trazer benefícios para outras empresas que se enquadrem na regra, mas é sempre uma interpretação muito restritiva da Receita Federal. Então, o contribuinte sempre fica preocupado se ele está fazendo certo ou não”, adiciona Wetzel Neto. “A insegurança jurídica vai continuar.”