Juíza afasta convênio e autoriza transferência de crédito de ICMS entre filiais
Fonte: Jota Tributario
A juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara de Fazenda Pública do
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), afastou os efeitos do Convênio ICMS
109/2024, do Confaz, para permitir que uma empresa transfira os créditos de
ICMS, sem a incidência do imposto, em operações de mera transferência entre
unidades do mesmo contribuinte. A decisão também permite que não seja feito
o destaque do imposto no documento fiscal.
Casoretti considerou que, embora não haja fato gerador na transferência de
mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo titular, também não há
impedimento legal para que a matriz mantenha os créditos de ICMS, ainda que
remeta as mercadorias para sua filial localizada em outro estado.
O Convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) ICMS
109/2024, inserido na legislação paulista pelo Decreto 69.127/2024, determina
a obrigatoriedade de transferência dos créditos de ICMS do estabelecimento de
origem para o de destino nas remessas interestaduais de bens e mercadorias
entre estabelecimentos de mesma titularidade.
Para a magistrada, entretanto, o Convênio não tem o condão de criar ou
restringir um direito assegurado constitucionalmente, sob pena de ofensa ao
princípio da legalidade. Na decisão, ela aponta que a questão da não incidência
de ICMS nas operações de deslocamento de mercadorias de um
estabelecimento para outro do mesmo contribuinte está superada, conforme já
decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp 1.125.133/SP e
fixado na Súmula 166, pois não há fato gerador do imposto.
A magistrada ressaltou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu sobre
o tema ao firmar tese no julgamento do ARE 1.255.885 (Tema 1099), sobre a
não incidência, além de ter decidido na Ação Declaratória de
Constitucionalidade (ADC) 49 que a transferência de mercadorias não implica
no afastamento do direito ao crédito da operação anterior em respeito ao
princípio da não cumulatividade e, assim, devem ser mantidos os créditos.
O caso concreto envolve uma empresa que buscava o reconhecimento do
direito à apropriação facultativa do crédito de ICMS em operações de
transferências de bens entre seus estabelecimentos, localizados em diferentes
estados. A matriz está situada no Paraná e as filiais nos estados de Minas Gerais
e Espírito Santo.
As filiais são dedicadas ao comércio varejista de brinquedos e artigos
recreativos, e costumam transferir mercadorias entre seus estabelecimentos
para aumentar a eficiência logística e suprir as demandas de determinada
localidade. Em razão da natureza de suas atividades e do local em que estão
situadas, devem recolher o ICMS em favor do estado de São Paulo.
De acordo com o advogado Felipe Mano, sócio da área tributária do Colonhese
Advogados e representante da defesa da empresa, a liminar é uma das primeiras
manifestações judiciais sobre a controvérsia da facultatividade da transferência
de créditos de ICMS na vigência do novo Convênio ICMS 109/2024 e do
Decreto Estadual 69.127/2024, do estado de São Paulo.
“Com notável atenção ao resultado do julgamento dos embargos de declaração
opostos nos autos da ADC 49, a magistrada reconhece que o Convênio
109/2024 afigura-se como uma tentativa de restringir a facultatividade plena do
contribuinte de dispor sobre os créditos de ICMS na origem. Além disso, reputa
tal medida como contrária ao comando constitucional da não cumulatividade e
à reserva legal”, afirmou Mano.
Entendimentos contrários
Embora a juíza tenha sido favorável ao contribuinte, a decisão destoa de outras
recentes, o que demonstra o quanto a matéria divide entendimentos na
magistratura paulista. Em 26 de maio, a juíza Camila Paiva Portero, da Vara da
Fazenda Pública do Foro de Araçatuba (SP), negou o pedido de liminar a uma
empresa de artigos esportivos que pedia a suspensão do Convênio ICMS
109/2024, do Decreto 69.127/2024 e do próprio tributo que poderia
eventualmente ser exigido nas operações.
Ao analisar o processo, a magistrada afirmou que não foi observada ilegalidade
para subsidiar uma decisão suspendendo a exigência. “A priori, há de prevalecer
a presunção de legitimidade e legalidade inerente ao ato administrativo”,
concluiu Portero. O processo tramita com o número 1008260-
79.2025.8.26.0032.
A 6ª Câmara de Direito Público do TJSP negou seguimento a um recurso que
buscava reverter decisão de primeiro grau que negou pedido para que o fisco se
abstivesse de autuar a empresa, caso optasse por transferir ou não o crédito de
ICMS de sua matriz para uma filial. No processo, o estabelecimento pediu a
garantia ao direito de optar pela transferência ou não dos créditos de ICMS de
operações anteriores, nos casos de remessa de mercadorias para
estabelecimentos de mesma titularidade, conforme determinado na ADC 49. A
contribuinte também pediu a suspensão da obrigatoriedade de transferência dos
créditos nas operações de remessa de mercadorias entre seus estabelecimentos
em Campinas (SP) e Jacutinga (MG).
“É entendimento pacificado nos tribunais superiores que a transferência de
mercadorias/bens/produtos entre estabelecimentos do mesmo titular de
direito não caracteriza a ocorrência do fato gerador do ICMS, uma vez que não
há comercialização de bens ou serviços”, afirmou o desembargador Joel Birello
Mandelli. O caso tramita sob o número 2096011-86.2025.8.26.0000.
Em outro processo colegiado, a 11ª Câmara de Direito Público do TJSP
manteve uma decisão proferida pela Vara da Fazenda Pública de Sorocaba (SP)
que negou a liminar a uma empresa que buscava o reconhecimento do seu
direito de manutenção dos créditos de ICMS no estado de origem, em remessa
interestadual de mercadorias entre estabelecimentos da mesma titularidade.
O desembargador Ricardo Dip, relator do acórdão, entendeu não haver risco
de dano irreparável ou de difícil reparação no caso e, por essa razão, votou para
negar o pedido de liminar. A companhia argumentava que o Convênio ICMS e
o Decreto estadual dispuseram sobre o caráter facultativo da transferência dos
créditos de ICMS ao estado de destino em hipóteses como a dos autos, o que
afastaria interpretações fazendárias. A decisão foi tomada no processo de
número 2091869-39.2025.8.26.000.