25/11/2025

Empresas reveem processos para se adaptar a novo dividendo

Por: Rodrigo Carro e Rita Azevedo
Fonte: Valor Econômico
Aguardando sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o projeto de lei
1087, de 2025, mobiliza empresas de capital aberto que buscam a melhor forma
de se adaptar à cobrança de uma alíquota de 10% sobre lucros e dividendos
prevista no texto. A toque de caixa, companhias preparam a convocação de
assembleias de acionistas para deliberar sobre a distribuição dos lucros obtidos
até 31 de dezembro. Isso porque o projeto prevê que lucros e dividendos
apurados até 2025 não serão tributados, contanto que a distribuição tenha sido
aprovada ainda neste ano.
As incertezas com relação à nova lei, que pode inclusive ser alterada por vetos
do presidente Lula, ficaram evidentes em teleconferências de empresas para
detalhar resultados do terceiro trimestre. Companhias como Caixa Seguridade,
Direcional, Mills e Unipar informaram, em conversas recentes com analistas,
que ainda não tomaram decisões e que estudam caminhos diversos para lidar
com a nova lei.
Tributaristas confirmam um aumento nas consultas sobre o tema, que ainda
gera dúvidas. Isso porque o projeto aprovado tem pontos conflitantes com a
Lei das Sociedades por Ações (S.A.). “Ou as empresas vão brigar com a CVM
[Comissão de Valores Mobiliários] ou com o fisco”, resume Rodrigo Maito,
sócio da área tributária do escritório Dias Carneiro Advogados. “Há um
completo descompasso entre o projeto aprovado e a lei societária”.
Enquanto a Lei da S.A. determina que o dividendo deverá ser pago em até 60
dias no exercício social em que houver a deliberação, o projeto aprovado
estabelece prazo até 2028 para o pagamento dos lucros e dividendos apurados
até o fim deste ano.
O prazo até 31 de dezembro para as empresas deliberarem sobre a distribuição
de lucros “do passado” tende a gerar uma corrida para fechar balancetes
intermediários, uma vez que os resultados completos e auditados do quarto
trimestre só serão divulgados no próximo ano. “O problema é que isso fica
incompatível para as sociedades anônimas”, ressalta Maito.
Em teleconferência, Ricardo Gontijo, presidente da incorporadora Direcional,
afirmou que a empresa ainda está “vendo o que vai fazer” de forma a minimizar
o impacto aos acionistas, mas que está bem preparada para essa realidade, dada
a posição de caixa e de alavancagem. “Estamos vendo o que é possível ser feito
sempre mantendo o nosso conservadorismo e disciplina”.
A Mills também estuda alternativas para “garantir o melhor retorno ao
acionista”, mas ainda não tem uma estratégia definida, disse Renata Vaz,
diretora financeira da empresa de aluguel de máquinas e equipamentos.
Na Plano&Plano, a mudança na tributação “provoca a empresa para tentar
garantir o máximo de dividendos possível para os acionistas”, segundo João
Luis Ramos Hopp, diretor financeiro. Mas a decisão depende de fatores, como
o apetite de crescimento da empresa e o cumprimento dos “covenants”
(cláusulas contratuiais de obrigações), segundo afirmou o executivo na
teleconferência.
A Mahle Metal Leve já decidiu que não irá antecipar dividendos, levando em
conta o custo financeiro, disse Claudio César Braga, diretor financeiro da
empresa. Ele afirmou a analistas que a administração da empresa estudou o
tema, avaliando, por exemplo, o perfil dos investidores. “O que eu posso falar
é que se a lei se mantiver da forma como está hoje, não temos a intenção de
antecipar dividendos.”
Vice-presidente financeiro da Porto, Celso Damadi disse que a seguradora
também acompanha possíveis mudanças no texto. “Vamos ver como será para
decidirmos”, pontuou a analistas. Ele adiantou, porém, que a distribuição de
dividendos adicionais em 2025 não está nos planos. “A nossa expectativa é
pagar 50% [do lucro] neste ano. Nos anos seguintes, com a geração de caixa
que temos, vemos algumas possibilidades, disse.
Já o conselho da Vulcabras aprovou no fim de outubro um aumento de capital
de até R$ 597,6 milhões, destinado à conta de capital social e à formação de
reserva de capital, em conta de ágio na subscrição de ações.
“Estamos chamando um aumento de capital, fazendo essa alocação de R$ 598
milhões, na iminência da reforma tributária que deve taxar dividendos. É uma
forma de trazer um planejamento tributário que favoreça os acionistas sem
impor ao balanço da Vulcabras uma alavancagem desnecessária”, disse ao Valor
na época o diretor financeiro da Vulcabrás, Wagner Dantas.
A movimentação em torno do assunto é intensa, conta Alamy Candido,
tributarista do escritório de advocacia Candido Martins Cukier. “O trabalho
desse mês está todo focado nisso.”
Na avaliação dele, os caminhos para se adequar ao iminente novo cenário
tributário são limitados. Uma alternativa seria a capitalização. Ao utilizar
reservas de lucro para aumentar seu capital social, a empresa pode realizar uma
bonificação de ações. Trata-se de um remanejamento contábil, dentro do
balanço. As ações emitidas para fazer frente a esse aumento de capital são
distribuídas sem custo aos acionistas. “Não é tão simples em estruturas
societárias complexas.”
Para as empresas que tiveram lucro e contam com dinheiro em caixa, existe a
opção de simplesmente pagar o dividendo. Já no polo oposto - aquelas sem
recursos para pagar os proventos - a saída seria contrair dívida. Com isso, há
uma expectativa de aumento da demanda por financiamento, ainda que ela seja
limitada pelo patamar elevado dos juros.
Uma opção intermediária seria transferir valores do patrimônio líquido e lançálos
como passivo (devido aos acionistas) no balanço da empresa, para mais
adiante decidir efetivamente o que será feito com os recursos. Na dúvida, “todo
mundo está preparando ata, convocando assembleia”, diz Maito.
Uma variável adicional que, segundo Candido, gera “um pouco de insegurança”
é a possibilidade de Lula vetar o prazo até 2028 para pagamento dos “lucros do
passado”. Em caso de veto, seriam duas as leituras possíveis: numa delas, os
valores auferidos até 2025 poderiam ser pagos quando as companhias quiserem.
Outra interpretação é a de que o desembolso de dividendos teria de ser feito
necessariamente este ano.
“É melhor sancionar do jeito que [o projeto de lei] está. Já tivemos muitas
discussões. Se [o presidente] vetar, vai gerar uma correria [para pagar
dividendos], começa a gerar desconforto no mercado”, avalia o advogado
tributarista. (Colaborou Ana Luiza de Carvalho)