Concessionária consegue no Supremo reduzir IPTU de aeroporto
Fonte: Valor Econômico
Empresas que administram aeroportos no país conseguiram, no Supremo
Tribunal Federal (STF), um importante precedente sobre pagamento de IPTU.
A 1ª Turma decidiu que a Inframerica não é obrigada a recolher o imposto sobre
toda a área do Aeroporto de Natal (RN), localizado em São Gonçalo do
Amarante, na região metropolitana da capital. Incidiria apenas sobre os espaços
ocupados por lojas, restaurantes e locadoras de veículos - onde há exploração
comercial.
Os ministros entenderam que as áreas que abrigam pista e hangar, por exemplo,
não devem entrar no cálculo do imposto municipal. A decisão, de acordo com
especialistas, vale também como precedente para concessões de ferrovias e
portos (Rcl 60726).
O julgamento, finalizado no Plenário Virtual, cancela autos de infração de 2012
a 2017, que totalizam cerca de R$ 70 milhões, segundo a Inframerica. Os
ministros analisaram reclamação do município de São Gonçalo do Amarante
contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) que
livrou a empresa de pagar o IPTU sobre a área total do aeroporto.
A Inframerica, após as autuações, passou a defender na Justiça que não deveria
pagar nada de IPTU. Para o advogado que assessora a companhia, Gilvandro
Araújo, sócio do Carneiros Advogados, a isenção de impostos de um ente da
federação para órgãos que prestam serviços públicos, prevista no artigo 150,
inciso VI, alínea a, da Constituição, seria extensível às concessionárias. “O
aeroporto continua sendo da União e está em regime de concessão. Por isso
não faz sentido essa cobrança”, diz.
Estender a imunidade a lojas violaria o princípio da livre concorrência”
— Bruno Sigaud
Após sentença favorável à Inframerica, mantida em segunda instância, o
município decidiu ingressar com reclamação no Supremo. Alegou haver afronta
a decisões em repercussão geral, entre elas a que estabeleceu cobrança de IPTU
sobre imóvel de pessoa jurídica de direito público cedido a pessoa jurídica de
direito privado (Tema 437).
Em agosto, o relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, em decisão
monocrática, suspendeu a decisão do TJRN, por considerar que violaria
precedentes vinculantes do STJ. Porém, reconsiderou seu posicionamento ao
levar seu voto no Plenário Virtual, na semana passada.
Barroso afirmou que, no julgamento do Tema 437, os votos que formaram a
corrente vencedora destacaram a desvinculação do bem imóvel de suas
finalidades públicas como elemento central a justificar a incidência do tributo e
sua cobrança ao particular.
Ainda lembrou que, no julgamento do Tema 385, o STF fixou a posição de que
a imunidade “não se estende a empresa privada arrendatária de imóvel público,
quando seja ela exploradora de atividade econômica com fins lucrativos” (RE
594.015).
Para ele, com base nos dois julgamentos, “a imunidade tributária recíproca não
é aplicável a imóveis que, embora formalmente pertencentes a entes públicos,
sejam utilizados por concessionários ou arrendatários para a exploração de
atividades econômicas com finalidade lucrativa”.
Assim, no caso do Aeroporto de Natal, acrescentou o ministro, “as
circunstâncias fáticas não permitem que seja reconhecida a imunidade tributária
em relação a todos os segmentos do complexo aeroportuário”, uma vez que
também existem atividades acessórias com exploração de atividades
econômicas por empresas privadas, e que estão dissociadas da prestação do
serviço público essencial.
Ele citou, em seu voto, que o Supremo definiu no mesmo sentido no
julgamento da Reclamação 50.522. A 2ª Turma decidiu pela exclusão da
imunidade tributária dos imóveis cedidos para o desempenho, por particulares,
de atividades econômicas alheias ao serviço aeroportuário e ao transporte aéreo.
No entendimento do ministro, devem ser excluídos da imunidade tributária
recíproca do IPTU “os imóveis pertencentes ao complexo aeroportuário
cedidos a particulares para a exploração de atividade econômica com intuito de
lucro, e que sejam alheios ao serviço público stricto sensu de infraestrutura
aeroportuária”.
De acordo com Bruno Sigaud, do Sigaud Advogados, de fato, o instituto da
imunidade tributária recíproca não foi concebido para evitar a cobrança de
IPTU de particulares que atuam no regime da livre concorrência. “Nesse
sentido, estender a imunidade do IPTU aos imóveis ocupados pelas lojas,
restaurantes e locadoras de veículos, onde há exploração comercial,
representaria conferir a tais particulares uma vantagem indevida, benefício este
não existente para os seus concorrentes”, afirma ele, acrescentando que a
medida violaria o princípio da livre concorrência, previsto no artigo 170 da
Constituição.
Sobre a manutenção da imunidade de IPTU aos hangares, pista de pouso e
outras áreas, Sigaud afirma que “certamente atende ao instituto da imunidade
recíproca, justamente em razão da necessidade de se observar que, no contexto
do pacto federativo, a Constituição objetivou preservar o respeito recíproco e
a autonomia dos entes públicos”.
Procurada pelo Valor, a Prefeitura de São Gonçalo do Amarante não deu
retorno até o fechamento da edição.