06/02/2025

OAB-RJ vai ao CNJ contra adoção da Selic para reajuste das custas judiciais no Rio

Por: Adriana David
Fonte: Valor Econômico
A seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro (OAB-RJ)
apresentou, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), um pedido de providências
contra a adoção da Selic pelo Tribunal de Justiça (TJRJ) para o reajuste anual
das custas judiciais. O Rio de Janeiro é hoje o único Estado a adotar a taxa
básica de juros. Até então, era usada a Unidade Fiscal de Referência (UFIR-RJ).
A Selic está prevista na Lei estadual nº 10.632, sancionada em dezembro.
Levantamento feito pelo advogado Gabriel de Britto Silva, especialista em
Direito Imobiliário e participante da Comissão de Arbitragem da OAB-RJ,
mostra que os demais Estados e o Distrito Federal adotam índices de inflação,
como INPC, IPCA, IGP-DI, ou a UFIR. A diferença é grande. Enquanto o
IPCA variou 4,83% em 2024, a Selic fechou o ano em 10,75%. Já o valor da
UFIR-RJ foi reajustado em 4,7% no início do ano passado.
Britto lembra que a taxa Selic engloba não só correção monetária, mas também
juros. “Não haverá apenas a compensação pela perda de valor da moeda com
o decurso do tempo, função da correção monetária, mas uma penalização, via
incidência de juros, do cidadão do Rio que objetivar acessar o Poder Judiciário
e os cartórios extrajudiciais”, diz.
Presidente da OAB-RJ, Ana Tereza Basílio, espera que o CNJ se pronuncie
sobre o assunto. Segundo ela, no início de 2024, quando a entidade procurou o
CNJ para apontar aumentos “excessivos” nas custas judiciais, não houve
nenhum posicionamento. Entre 2021 e 2023, o TJRJ aumentou em 45% o valor
das custas. “Esperamos providências do CNJ, pois não é possível essa
discrepância no Brasil”, afirma.
A advogada lembra que, em dezembro de 2024, os valores cobrados no Rio de
Janeiro já estavam muito acima dos praticados nos outros Estados. Um agravo
de instrumento custava R$ 1.100 no Rio, enquanto no Distrito Federal, R$ 47,
exemplifica. “Com o uso da Selic para a atualização dos valores, ficará proibitivo
entrar com ação judicial”, diz a presidente da OAB-RJ.
De acordo com o estudo do CNJ “Diagnóstico das Custas Processuais
Praticadas nos Tribunais - 2023”, a Justiça fluminense é a que cobra o maior
valor de custas iniciais e taxas judiciárias mínimas, totalizando R$ 795,43. No
Supremo Tribunal Federal (STF), o valor é de R$ 450,08. Há Estados, como
São Paulo ou o Distrito Federal, com montantes ainda mais baixos. Na Justiça
paulista, é de R$ 159,84 e no Distrito Federal, R$ 39,81.
O CNJ também fez uma simulação dos valores de custas judiciais, de acordo
com valores de causas, que está nesse levantamento. Considerando uma causa
de R$ 100 mil, a Justiça do Rio de Janeiro cobra R$ 3.427,33 de custas. O valor
é mais do que o dobro do adotado pelos tribunais de Minas Gerais (R$ 1.364,30)
e Espírito Santo (R$ 1.500,00), e mais do que o triplo do cobrado em São Paulo
(R$ 1 mil).
Além do custo alto, o tempo médio do início de um processo até a sentença no
primeiro grau é de três anos e nove meses - o maior entre todos os tribunais
estaduais, cuja média é de dois anos e oito meses, 29% menor que o praticado
no Rio. Esses dados constam no Relatório Justiça em Números 2024, do CNJ.
“O TJRJ é o mais lento e também o mais caro, segundo o CNJ, por falta
servidor. Não pode ser caro com serviço insuficiente. Isso prejudica a todos”,
afirma Ana Tereza.
Agora, Britto não descarta que outros Estados comecem a adotar a atualização
pela Selic, pois representaria um “forte” aumento de receita. “Em um país em
que o Poder Público tem uma visão reconhecidamente arrecadatória e que,
muita das vezes, não dá a devida relevância ao princípio da modicidade do valor
dos serviços públicos, é possível que esse movimento ocorra”, diz ele,
acrescentando ser “urgente que o CNJ discipline e uniformize a forma de
atualização anual das custas e emolumentos no país”.
Por outro lado, afirma ele, a tendência é de fortalecimento dos métodos
alternativos de resolução de conflitos - conciliação, mediação e arbitragem -,
que “estariam cada vez mais acessíveis”. “Estamos passando por um
movimento de democratização desses métodos. Câmaras de arbitragem estão
ofertando julgamento com um único árbitro, sob um rito mais enxuto,
reduzindo os valores envolvidos”, diz.
Há câmaras arbitrais, destaca, com tabela das custas com valores inferiores aos
das custas judiciais. “Conflitos locatícios, condominiais e os relativos a
negociações imobiliárias passam a ser crescentemente dirimidos pela
arbitragem”, exemplifica Britto.
O Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá
(CAM-CCBC), localizada em São Paulo, a mais antiga do país, que administra
litígios de alto valor, já possui julgamento com árbitro único. Na calculadora do
CAM-CCBC, é possível fazer uma simulação do custo de arbitragem.
O procedimento expedito - com um único árbitro - apresenta um custo mínimo
de cerca de R$ 40 mil ante o valor de um julgamento pelo tribunal arbitral, com
três árbitros, de cerca de R$ 215 mil.
Do mesmo modo, no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA),
localizado no Rio de Janeiro, para procedimento expedito, com um árbitro, de
causas com valores de até R$ 200 mil, o custo gira em torno de R$ 18 mil. Na
2ª Câmara de Conciliação e Arbitragem de Caldas Novas (GO), os valores são
ainda mais acessíveis. Utilizando o procedimento padrão e com julgamento por
árbitro único, para causas de valores até R$ 250 mil, o custo é de R$ 1.600.
Indignado com a medida que considera “onerosa e prejudicial à atividade
econômica”, Josier Vilar, presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro
(ACRJ), chegou a enviar pedido ao governador Cláudio Castro (PL), para que
não promulgasse a mudança de modelo de cobrança das custas judiciais. “Você
está inibindo que pessoas possam ir para o Judiciário, resolver suas pendências”,
afirma. “O empresariado ficará cada vez mais impactado pelas custas
processuais.”
Em nota, o TJRJ informa que “o objetivo da alteração é a padronização do
índice de reajuste das custas do sistema judicial fluminense com as práticas
nacionais” - que seriam adotadas, segundo o tribunal, pelo Supremo Tribunal
Federal e a Justiça Federal. E destaca que isso desempenha um papel
fundamental para a garantia do acesso à justiça, promovendo medidas como a
gratuidade de justiça para cidadãos economicamente vulneráveis.
Acrescenta que “o contexto das custas judiciais do TJRJ requer uma análise
detalhada, considerando o significativo número de processos com gratuidade
de justiça - no percentual de 1/3 (um terço) de todas as ações em curso na
Justiça deste Estado - e o custo para manutenção e funcionamento do Poder
Judiciário fluminense”.