19/09/2024

Entenda o potencial de arrecadação de impostos e taxas com a regulamentação das bets

Por: Paulo SaldañaCézar Feitoza
Fonte: Folha de S. Paulo
O governo federal, que lidera o processo de regulamentação das apostas
esportivas online, as chamadas bets, não tem uma projeção certeira de quanto
poderá arrecadar em impostos com esse mercado. A legalização final entrará
em vigor em janeiro de 2025.
A gestão Lula (PT) chegou a mencionar, ainda no ano passado, um potencial
de arrecadação de até R$ 12 bilhões por ano. Mas, atualmente, o Ministério da
Fazenda, por meio da Secretaria de Prêmios e Apostas, é mais cauteloso com
os números.
Isso ocorre principalmente porque, por se tratar de um setor que atua sem
regulação, as estimativas de movimentação financeira são imprecisas.
"Tem gente olhando as apostas, e tem gente olhando o fluxo entre ganhos e
perdas. Com isso, há uma dificuldade de quantificar de fato qual é o tamanho
do setor e, por conta dessa dificuldade, a gente não tem o elemento básico para
saber qual seria a arrecadação", disse o secretário de Prêmios e Apostas, Regis
Dudena, em entrevista à Folha no fim de agosto.
A oferta de sites de apostas esportivas é liberada no Brasil desde 2018, após lei
aprovada no governo Michel Temer (MDB). O governo de Jair Bolsonaro (PL)
teve quatro anos para regulamentar o mercado, mas não o fez.
O governo Lula dedica-se à regulamentação desde 2023, quando houve a edição
de uma medida provisória. No ano passado, o Congresso aprovou uma lei e
definiu taxação e funcionamento das empresas.
Pelas regras já definidas, esse mercado teria uma tributação similar a outros
setores, com uma alíquota de 12% sobre a arrecadação das casas de apostas,
descontado o pagamento dos prêmios.
Essas empresas também estão sujeitas à tributação do lucro com IRPJ/CSLL e
do faturamento com PIS/Cofins. Os municípios podem cobrar ISS. Assim, a
carga tributária é estimada em 35%.
Já apostadores devem pagar 15% de Imposto de Renda sobre o valor obtido
com a premiação.
A carga pode sofrer alteração com a reforma tributária. No texto aprovado na
Câmara, e que agora está no Senado, as jogos de azar entraram na lista do
Imposto Seletivo, o chamado "imposto do pecado". Ele foi criado para
desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde.
Assim como o setor de casas de apostas, o governo é contra essa inclusão. A
avaliação, presente nos estudos do Ministério da Fazenda para desenhar a
regulamentação, é de que uma alta carga tributária favorece o mercado ilegal —
o que pode provocar redução no potencial de arrecadação.
Informações do mercado indicam que, mesmo sem o imposto do pecado, a
tributação das apostas online por aqui deve superar a de outros locais com
maiores cargas. Em Macau e Austrália, por exemplo, o percentual gira em torno
de 30%
"A questão do favorecimento ao mercado legal é realidade, e muito séria", diz
Leonardo Benites, da ANJL (Associação Nacional de Jogos e Loterias),
entidade que representa casas de apostas. Segundo ele, o Brasil teria dificuldades
tecnológicas de lidar com sites não legais.
"Decidir por aumento de impostos, antes mesmo de saber o tamanho real desse
mercado, é um empurrão para quem quer ser legal, pagar impostos e proteger
os apostadores, sair do país. O mercado vai existir, a diferença é saber se será
legal ou ilegal", completa.
Em janeiro, pesquisa Datafolha revelou que 15% dos brasileiros dizem fazer ou
já ter feito apostas esportivas online. O gasto médio mensal entre o total de
A Folha mostrou que os gastos de brasileiros com apostas online atingiram, de
janeiro a novembro de 2023, R$ 54 bilhões, segundo estimativa feita pela Folha
com base em estatísticas do Banco Central sobre remessas feitas para empresas
do setor que atuam no exterior. Outro levantamento, do banco Itaú, estimou
que, entre junho de 2023 e junho de 2024, jogadores desembolsaram R$ 68,2
bilhões nesse tipo de atividade e receberam de volta R$ 44,3 bilhões.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse nesta terça-feira (17) que as
apostas viraram um "problema social". A secretaria de Prêmios e Apostas
publicou também na terça uma portaria alterando um prazo de legalização
diante de denúncias recentes e, sobretudo, após projetos de lei no Congresso
contrários às bets.
O início da operação legal, e da consequente arrecadação de impostos, continua
sendo em janeiro de 2025, como previsto anteriormente. Mas, com a nova
portaria, só empresas que se cadastraram para atuar de forma legal no sistema
do governo, até 20 de agosto, serão consideradas legais para continuar atuando
a partir de 1 º de outubro.
Até antes dessa portaria, qualquer site poderia operar até o fim do ano. Agora,
as empresas não cadastradas serão consideradas ilegais, e o governo vai atuar
para tira-las do ar.
O governo recebeu 113 cadastros no prazo. Essas empresas controlam mais de
300 sites de bets, de um total estimado de cerca de 2 mil casas de apostas com
operação no país.
Como cada outorga custa R$ 30 milhões, o Ministério da Fazenda pode
arrecadar ainda neste ano ao menos R$ 3,39 bilhões. Ainda há a previsão de um
pagamento anual de uma taxa de fiscalização de até R$ 1,94 milhão.
O sistema para cadastro de novas empresas não será fechado. Assim, outras
casas de apostas podem se cadastrar para atuar de forma legal, mas sem garantia
de ter a autorização a partir de janeiro.
A legalização atinge os chamados jogos de quota fixa (em que se sabe quanto
se pode ganhar ou perder ao apostar). Durante a tramitação na Câmara, os
deputados incluíram nessa categoria também jogos online, onde entram
cassinos e outros jogos de azar em ambiente virtual.
Além das apostas online, o Senado analisa um projeto de lei que autoriza o
funcionamento de cassinos, do jogo do bicho, bingo e de outras modalidades
de jogos de azar. A proposta já foi aprovada pela Câmara em 2022 e teve aval
da Comissão de Constituição e Justiça do Senado em junho.
O texto atual prevê uma alíquota de 17% sobre a receita bruta das operadoras
de jogos. Já o Imposto de Renda dos prêmios teria alíquota de 20%.
A proposta ainda cria a taxa de fiscalização, com cobrança trimestral de
diferentes valores para cassinos (R$ 600 mil) e jogo do bicho e bingo (R$ 20
mil). O relator da proposta no Senado, senador Irajá Abreu (PSD-TO), estipula
que a legalização dessas modalidades geraria cerca de R$ 22 bilhões em
impostos anualmente.