10/03/2025

Acionistas agem contra plano do Carrefour

Por: Adriana Mattos
Fonte: Valor Econômico
Há uma movimentação mais ativa de acionistas minoritários pessoas físicas e
ligados a fundos para tentar mudar as condições do plano de incorporação e
troca de ações proposto pelo grupo Carrefour - há inclusive quem busque barrar
a operação.
Como informado pela varejista na sexta-feira (7), a assembleia geral
extraordinária (AGE) que vai deliberar sobre o tema está marcada para 7 de
abril. A empresa ainda divulgou, no mesmo dia, novos documentos e o laudo
de avaliação da empresa, que sustenta a proposta.
O Valor esteve, na semana passada, com representantes de fundos e pequenos
acionistas, alguns deles, ex-diretores executivos do Carrefour. Uma parcela não
quer barrar a proposta e considera analisar o plano caso seja alterado o preço
oferecido por ação, de R$ 7,70. Outros, ouvidos sob condição de anonimato,
preferem aguardar o processo de retomada do crescimento da empresa, passado
três duros anos de reestruturação, por isso são contra a proposta.
Apesar dessa percepção, os investidores admitem existir a barreira do volume
de ações pulverizado no mercado para unirem votos e buscar, pelo menos,
mudanças nas condições oferecidas.
No dia 11 de fevereiro, a varejista publicou fato relevante em que informou
sobre termos da proposta dos controladores franceses para unificar as bases
acionárias no país e na França.
Isso se daria por meio da incorporação das ações em circulação do Carrefour
Brasil por uma nova subsidiária detida pela cadeia francesa. Se a proposta
avançar, a companhia deixará o segmento Novo Mercado da B3, mas
continuará sendo de capital aberto. E converterá seu registro de companhia
aberta na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para a categoria B.
Não se trata de um fechamento de capital, já que a rede ainda poderá emitir
títulos de dívida, debêntures e recebíveis.
Foram oferecidas três condições: troca de 11 ações no Brasil por uma na França;
22 ações no país por uma na França, mais R$ 3,85; ou os R$ 7,70 por ação. O
investidor ainda pode optar pelos recibos de ação (BDRs) vinculados às ações
da matriz. Os R$ 7,70 representam um prêmio de 32% sobre a média ponderada
de preço por volume de um mês antes do anúncio.
Apenas acionistas que fazem parte dos 25,3% do “free-float”, o volume de
ações para livre negociação no mercado, poderão votar no dia. Os
controladores franceses e a Península Participações, maior acionista do grupo
na França - e que apoia a transação - não devem votar. Somados, ambos têm
74,7% da rede. A proposta pode ser aprovada por maioria simples na AGE.
É em cima desses números do “free-float” que minoritários contrários à
incorporação têm feito contas para tentar chegar aos cerca de 12,66% dos
papéis exigidos, ou cerca de 266,3 milhões de ações.
“Parte daqueles com quem falamos dizem que não querem esse desgaste,
preferem sair a R$ 7,70, mas há duas bancas de advogados que já contatamos
para ampliar esse trabalho na base”, diz um ex-vice-presidente da rede, com
papéis desde 2019.
Na semana passada, em uma dura carta a clientes, a Wishbone Partners,
investidora da rede, afirmou acreditar numa “revolta dos acionistas contra essa
transação flagrantemente injusta”. Ainda afirma que uma reação desse tipo “os
ensinará que não se pode colocar vinho velho estragado em garrafas do ‘Novo
Mercado’ e fingir que é algo novo”. O Valor apurou que a empresa estuda votar
contra a proposta.
Na carta, a Wishbone Partners lembra que o Carrefour abriu capital em 2017,
com a ação a R$ 15, aproximadamente o dobro do que oferece agora, e que isso
nada tem de “justo” e é algo “vergonhoso”. Afirma também, para defender a
tese de que há dinheiro sendo deixado na mesa, que o valor do braço imobiliário
da empresa é estimado em mais do que seu valor de mercado, em R$ 15,6
bilhões atualmente no país. Os R$ 7,70 estão abaixo do valor patrimonial da
empresa, com base no acumulado de 2024, em R$ 10,75.
Acrescenta, ainda, que a hipótese de receber ações na França não faz sentido
porque trata-se de um grupo “conhecido como um dos varejistas de alimentos
menos admirados da Europa, com uma avaliação baixa que reflete seu baixo
desempenho”, diz na carta.
Há um ambiente de insatisfação maior em duas gestoras de fundos com ações
da varejista, Tempo Capital e Vokin Investimentos, esta mais ativa junto ao
mercado nas últimas semanas, dizem fontes, além de acionistas ex-diretores da
empresa. Parte desses executivos foi dispensada após uma reestruturação de
cargos entre 2022 e 2024.
O Valor apurou que a gestora Onyx, incomodada principalmente com o
modelo de troca de ações, teria vendido sua posição na empresa após a proposta
apresentada pelos franceses.
Ainda segundo uma fonte, há outra frente sendo aberta, para levar
questionamentos sobre a operação no comitê de autorregulação da B3 e no
Sistema de Registro de Ofertas da CVM. Já existiriam duas datas pré-agendadas
para o contato. Até o momento, não há questionamentos de investidores
arquivados na base de procedimentos administrativos na CVM.
A Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) também já foi
contatada informalmente por investidores para se manifestar sobre a transação.
Há um total de cerca de 22 mil acionistas pessoas físicas, 457 como pessoas
jurídicas e 721 investidores institucionais na empresa na B3.
De acordo com um outro grupo de investidores pessoas jurídicas, que quer
revisão da proposta, dados publicados no laudo de avaliação da empresa,
anexado na CVM, mostram aceleração maior no crescimento da empresa até
2027.
Para eles, isso confirmaria a tese de que, agora que a rede está entrando numa
fase de “colher frutos”, o controlador decide incorporar o negócio com a
França. O laudo foi elaborado pela Apsis Consultoria, e usou como base dados
fornecidos pela empresa. O documento projeta crescimento (gerado por
expansão) para o Atacadão, o maior negócio do grupo, de 7,25% em 2026 e
9,1% em 2027. Para efeito de comparação, a taxa foi de 3,3% em 2024.
Procurado, o Carrefour reitera que sua oferta pelo Atacadão é “justa,
transparente e estruturada, em total conformidade com as melhores práticas de
governança”, e garante um processo equitativo e objetivo. Ainda destaca os
32% de prêmio, acima da média de outras transações envolvendo controle. E
“a oportunidade atraente” para os acionistas receberem um valor imediato e
certo ou continuarem investindo no grupo.
Em nota, reforça também que um comitê independente “analisou
cuidadosamente e negociou a oferta antes de recomendá-la ao conselho”. E que
a recomendação foi apoiada por um parecer independente, confirmando que o
preço da oferta refletia com precisão o valor intrínseco da empresa. A rede se
“orgulha do rigor e da independência do processo, conduzido em estrita
conformidade com os mais altos padrões de governança”.