‘Instabilidade prejudica 700 mil acionistas', diz ex-conselheiro da Petrobras

Por: Bruno Rosa
Fonte: Valor Econômico
RIO - O advogado Leonardo Pietro Antonelli, que integrou o Conselho de
Administração da Petrobras entre 2020 e 2021 e representa hoje
minoritários, diz que as mudanças impactam os investimentos da empresa
e seu valor de mercado.
Segundo ele, são 700 mil investidores que sofrem com a instabilidade
existente. Ele alerta para o fato de que a votação dos investidores
estrangeiros já começou, apesar de a chapa do governo estar incompleta.

Como as mudanças no comando afetam a empresa e sua governança?
As mudanças impactam, externamente, no valor da companhia na Bolsa e,
internamente, na instabilidade no cumprimento do planejamento
estratégico aprovado. Se compararmos o fato político do dia com o gráfico
das ações, eles caminham parelhos. A governança tem demonstrado
musculatura. Os dois últimos presidentes resistiram.
E o Conselho de Administração deu o suporte necessário para preservar o
caixa que, no passado, foi alvejado por desvios e política de subsídios que
causaram prejuízos superiores a R$ 300 bilhões.

É um risco para os acionistas a União fazer mudanças nas indicações do
conselho cada vez mais perto da assembleia?
Sem dúvidas. Isso não atende ao melhor interesse da companhia e, muito
menos dos acionistas, inclusive o próprio governo federal. A Petrobras é
uma sociedade de economia mista, em que o controlador ainda é a União.
Ser controlador significa deter mais de 50% das ações com direito a voto. E
isso o governo possui.
Porém, o capital da Petrobras pertence majoritariamente (64%) aos
acionistas privados. Isso significa dizer que a instabilidade existente
prejudica outros 700 mil investidores. Falta uma comunicação eficaz.

Esse entrave pode favorecer a cobiça de políticos na estatal?
A Petrobras começou o ano como a empresa da América Latina com maior
valor de mercado. Seu lucro foi recorde em 2021, de R$ 100 bilhões. É uma
grande pagadora de tributos e dividendos. É natural que possuindo um
orçamento superior a inúmeros municípios e estados possa despertar esse
desejo ardente, demasiadamente humano, seja ele político ou não.

O senhor já foi conselheiro da Petrobras. A recomendação contrária do
compliance é um impeditivo?
Exceto nas hipóteses legais de inelegibilidade, entendo que a
recomendação é meramente opinativa para a assembleia geral de
acionistas melhor deliberar. O voto da maioria dos investidores se traduz
em decisão soberana. O controlador, seja ele o governo, como no caso da
Petrobras, seja ele privado, em outras empresas, tem direito de destituir,
substituir e indicar membros da alta administração.
A Lei das S.A. assegura à União diretamente convocar assembleia. É
legalmente possível que o presidente indique o candidato de sua
preferência ao exercício de cargo no Conselho de Administração de uma
controlada.

Na última eleição (em 2021) houve problemas na contagem dos votos dos
investidores estrangeiros nos candidatos indicados pelos minoritários por
falhas no sistema, conforme reconhecido pela CVM. Foi tudo solucionado
para a próxima eleição, semana que vem?
O sistema do voto múltiplo permite ao minoritário acumular os votos num
só candidato, o que pode dar força para a eleição de um representante da
minoria. Graças a esse sistema, recebi mais de 4 bilhões de votos. A próxima
eleição, cuja votação já se iniciou no exterior, ocorrerá em dois formatos,
pelo voto cumulativo e em separado, de forma que o acionista que votar na
eleição em separado estará legalmente impedido de votar no cumulativo e
vice-versa.
Identificamos que um cliente, detentor de ADR (ações na Bolsa de NY),
poderá ter seus votos desconsiderados pois não recebeu o alerta no
material divulgado no exterior. O sistema permite votar em ambos, o que
levará a anulação do voto. E futura discussão na CVM.

Existe solução para proteger o consumidor do aumento dos combustíveis?
Sim. Já tive a oportunidade de defender perante o Conselho de
Administração que a União, enquanto controladora, deveria criar um fundo
de estabilização dos combustíveis, mesmo que utilizando os seus
dividendos, que superam os R$ 30 bilhões ou outros mecanismos através
da garantia que a sua participação no controle possibilita. Sempre
respeitando os investidores.